Missão, Caráter, Essência, Grail Triptych /Tryptychon Graal, Sonia von Homrich

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06 dezembro 2020

Artigo 15 Lei 10.406 de 10 de Janeiro de 2002

 

LEI Nº 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002

DOU de 11/01/2002 (nº 8, Seção 1, pág. 1)

Institui o Código Civil.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

PARTE GERAL

LIVRO I

DAS PESSOAS

TÍTULO I

Das Pessoas Naturais

CAPÍTULO I

Da Personalidade e da Capacidade

Art. 1º - Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil.

Art. 2º - A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

Art. 3º - São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:

I - os menores de dezesseis anos;

II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;

III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.

Art. 4º - São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer:

I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;

II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido;

III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;

IV - os pródigos.

Parágrafo único - A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.

Art. 5º - A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.

Parágrafo único - Cessará, para os menores, a incapacidade:

I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos;

II - pelo casamento;

III - pelo exercício de emprego público efetivo;

IV - pela colação de grau em curso de ensino superior;

V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria.

Art. 6º - A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva.

Art. 7º - Pode ser declarada a morte presumida, sem decretação de ausência:

I - se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida;

II - se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra.

Parágrafo único - A declaração da morte presumida, nesses casos, somente poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do falecimento.

Art. 8º - Se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultaneamente mortos.

Art. 9º - Serão registrados em registro público:

I - os nascimentos, casamentos e óbitos;

II - a emancipação por outorga dos pais ou por sentença do juiz;

III - a interdição por incapacidade absoluta ou relativa;

IV - a sentença declaratória de ausência e de morte presumida.

Art. 10 - Far-se-á averbação em registro público:

I - das sentenças que decretarem a nulidade ou anulação do casamento, o divórcio, a separação judicial e o restabelecimento da sociedade conjugal;

II - dos atos judiciais ou extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação;

III - dos atos judiciais ou extrajudiciais de adoção.

CAPÍTULO II

Dos Direitos da Personalidade

Art. 11 - Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.

Art. 12 - Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.

Parágrafo único - Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau.

Art. 13 - Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes.

Parágrafo único - O ato previsto neste artigo será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial.

Art. 14 - É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte.

Parágrafo único - O ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo.

Art. 15 - Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.

Art. 16 - Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome.

Art. 17 - O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória.

Art. 18 - Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda comercial.

Art. 19 - O pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome.

Art. 20 - Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.

Parágrafo único - Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes.

Art. 21 - A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta Norma.

CAPÍTULO III

Da Ausência

Seção I

Da Curadoria dos Bens do Ausente

Art. 22 - Desaparecendo uma pessoa do seu domicílio sem dela haver notícia, se não houver deixado representante ou procurador a quem caiba administrar-lhe os bens, o juiz, a requerimento de qualquer interessado ou do Ministério Público, declarará a ausência, e nomear-lhe-á curador.

Art. 23 - Também se declarará a ausência, e se nomeará curador, quando o ausente deixar mandatário que não queira ou não possa exercer ou continuar o mandato, ou se os seus poderes forem insuficientes.

Art. 24 - O juiz, que nomear o curador, fixar-lhe-á os poderes e obrigações, conforme as circunstâncias, observando, no que for aplicável, o disposto a respeito dos tutores e curadores.

Art. 25 - O cônjuge do ausente, sempre que não esteja separado judicialmente, ou de fato por mais de dois anos antes da declaração da ausência, será o seu legítimo curador.

§ 1º - Em falta do cônjuge, a curadoria dos bens do ausente incumbe aos pais ou aos descendentes, nesta ordem, não havendo impedimento que os iniba de exercer o cargo.

§ 2º - Entre os descendentes, os mais próximos precedem os mais remotos.

§ 3º - Na falta das pessoas mencionadas, compete ao juiz a escolha do curador.

Seção II

Da Sucessão Provisória

Art. 26 - Decorrido um ano da arrecadação dos bens do ausente, ou, se ele deixou representante ou procurador, em se passando três anos, poderão os interessados requerer que se declare a ausência e se abra provisoriamente a sucessão.

Art. 27 - Para o efeito previsto no artigo anterior, somente se consideram interessados:

I - o cônjuge não separado judicialmente;

II - os herdeiros presumidos, legítimos ou testamentários;

III - os que tiverem sobre os bens do ausente direito dependente de sua morte;

IV - os credores de obrigações vencidas e não pagas.

Art. 28 - A sentença que determinar a abertura da sucessão provisória só produzirá efeito cento e oitenta dias depois de publicada pela imprensa; mas, logo que passe em julgado, proceder-se-á à abertura do testamento, se houver, e ao inventário e partilha dos bens, como se o ausente fosse falecido.

§ 1º - Findo o prazo a que se refere o art. 26, e não havendo interessados na sucessão provisória, cumpre ao Ministério Público requerê-la ao juízo competente.

§ 2º - Não comparecendo herdeiro ou interessado para requerer o inventário até trinta dias depois de passar em julgado a sentença que mandar abrir a sucessão provisória, proceder-se-á à arrecadação dos bens do ausente pela forma estabelecida nos arts. 1.819 a 1.823.

Art. 29 - Antes da partilha, o juiz, quando julgar conveniente, ordenará a conversão dos bens móveis, sujeitos a deterioração ou a extravio, em imóveis ou em títulos garantidos pela União.

Art. 30 - Os herdeiros, para se imitirem na posse dos bens do ausente, darão garantias da restituição deles, mediante penhores ou hipotecas equivalentes aos quinhões respectivos.

§ 1º - Aquele que tiver direito à posse provisória, mas não puder prestar a garantia exigida neste artigo, será excluído, mantendo-se os bens que lhe deviam caber sob a administração do curador, ou de outro herdeiro designado pelo juiz, e que preste essa garantia.

§ 2º - Os ascendentes, os descendentes e o cônjuge, uma vez provada a sua qualidade de herdeiros, poderão, independentemente de garantia, entrar na posse dos bens do ausente.

Art. 31 - Os imóveis do ausente só se poderão alienar, não sendo por desapropriação, ou hipotecar, quando o ordene o juiz, para lhes evitar a ruína.

Art. 32 - Empossados nos bens, os sucessores provisórios ficarão representando ativa e passivamente o ausente, de modo que contra eles correrão as ações pendentes e as que de futuro àquele forem movidas.

Art. 33 - O descendente, ascendente ou cônjuge que for sucessor provisório do ausente, fará seus todos os frutos e rendimentos dos bens que a este couberem; os outros sucessores, porém, deverão capitalizar metade desses frutos e rendimentos, segundo o disposto no art. 29, de acordo com o representante do Ministério Público, e prestar anualmente contas ao juiz competente.

Parágrafo único - Se o ausente aparecer, e ficar provado que a ausência foi voluntária e injustificada, perderá ele, em favor do sucessor, sua parte nos frutos e rendimentos.

Art. 34 - O excluído, segundo o art. 30, da posse provisória poderá, justificando falta de meios, requerer lhe seja entregue metade dos rendimentos do quinhão que lhe tocaria.

Art. 35 - Se durante a posse provisória se provar a época exata do falecimento do ausente, considerar-se-á, nessa data, aberta a sucessão em favor dos herdeiros, que o eram àquele tempo.

Art. 36 - Se o ausente aparecer, ou se lhe provar a existência, depois de estabelecida a posse provisória, cessarão para logo as vantagens dos sucessores nela imitidos, ficando, todavia, obrigados a tomar as medidas assecuratórias precisas, até a entrega dos bens a seu dono.

Seção III

Da Sucessão Definitiva

Art. 37 - Dez anos depois de passada em julgado a sentença que concede a abertura da sucessão provisória, poderão os interessados requerer a sucessão definitiva e o levantamento das cauções prestadas.

Art. 38 - Pode-se requerer a sucessão definitiva, também, provando-se que o ausente conta oitenta anos de idade, e que de cinco datam as últimas notícias dele.

Art. 39 - Regressando o ausente nos dez anos seguintes à abertura da sucessão definitiva, ou algum de seus descendentes ou ascendentes, aquele ou estes haverão só os bens existentes no estado em que se acharem, os sub-rogados em seu lugar, ou o preço que os herdeiros e demais interessados houverem recebido pelos bens alienados depois daquele tempo.

Parágrafo único - Se, nos dez anos a que se refere este artigo, o ausente não regressar, e nenhum interessado promover a sucessão definitiva, os bens arrecadados passarão ao domínio do Município ou do Distrito Federal, se localizados nas respectivas circunscrições, incorporando-se ao domínio da União, quando situados em território federal.

TÍTULO II

Das Pessoas Jurídicas

CAPÍTULO I

Disposições Gerais

Art. 40 - As pessoas jurídicas são de direito público, interno ou externo, e de direito privado.

Art. 41 - São pessoas jurídicas de direito público interno:

I - a União;

II - os Estados, o Distrito Federal e os Territórios;

III - os Municípios;

IV - as autarquias;

V - as demais entidades de caráter público criadas por lei.

Parágrafo único - Salvo disposição em contrário, as pessoas jurídicas de direito público, a que se tenha dado estrutura de direito privado, regem-se, no que couber, quanto ao seu funcionamento, pelas normas deste Código.

Art. 42 - São pessoas jurídicas de direito público externo os Estados estrangeiros e todas as pessoas que forem regidas pelo direito internacional público.

Art. 43 - As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.

Art. 44 - São pessoas jurídicas de direito privado:

I - as associações;

II - as sociedades;

III - as fundações.

Parágrafo único - Excluído;

Parágrafo único - As disposições concernentes às associações aplicam-se, subsidiariamente, às sociedades que são objeto do Livro II da Parte Especial deste Código.

Art. 45 - Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo.

Parágrafo único - Decai em três anos o direito de anular a constituição das pessoas jurídicas de direito privado, por defeito do ato respectivo, contado o prazo da publicação de sua inscrição no registro.

Art. 46 - O registro declarará:

I - a denominação, os fins, a sede, o tempo de duração e o fundo social, quando houver;

II - o nome e a individualização dos fundadores ou instituidores, e dos diretores;

III - o modo por que se administra e representa, ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente;

IV - se o ato constitutivo é reformável no tocante à administração, e de que modo;

V - se os membros respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais;

VI - as condições de extinção da pessoa jurídica e o destino do seu patrimônio, nesse caso.

Art. 47 - Obrigam a pessoa jurídica os atos dos administradores, exercidos nos limites de seus poderes definidos no ato constitutivo.

Art. 48 - Se a pessoa jurídica tiver administração coletiva, as decisões se tomarão pela maioria de votos dos presentes, salvo se o ato constitutivo dispuser de modo diverso.

Parágrafo único - Decai em três anos o direito de anular as decisões a que se refere este artigo, quando violarem a lei ou estatuto, ou forem eivadas de erro, dolo, simulação ou fraude.

Art. 49 - Se a administração da pessoa jurídica vier a faltar, o juiz, a requerimento de qualquer interessado, nomear-lhe-á administrador provisório.

Art. 50 - Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Art. 51 - Nos casos de dissolução da pessoa jurídica ou cassada a autorização para seu funcionamento, ela subsistirá para os fins de liquidação, até que esta se conclua.

§ 1º - Far-se-á, no registro onde a pessoa jurídica estiver inscrita, a averbação de sua dissolução.

§ 2º - As disposições para a liquidação das sociedades aplicam-se, no que couber, às demais pessoas jurídicas de direito privado.

§ 3º - Encerrada a liquidação, promover-se-á o cancelamento da inscrição da pessoa jurídica.

Art. 52 - Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade.

CAPÍTULO II

Das Associações

Art. 53 - Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos.

Parágrafo único - Não há, entre os associados, direitos e obrigações recíprocos.

Art. 54 - Sob pena de nulidade, o estatuto das associações conterá:

I - a denominação, os fins e a sede da associação;

II - os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados;

III - os direitos e deveres dos associados;

IV - as fontes de recursos para sua manutenção;

V - o modo de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos e administrativos;

VI - as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a dissolução;

Art. 55 - Os associados devem ter iguais direitos, mas o estatuto poderá instituir categorias com vantagens especiais.

Art. 56 - A qualidade de associado é intransmissível, se o estatuto não dispuser o contrário.

Parágrafo único - Se o associado for titular de quota ou fração ideal do patrimônio da associação, a transferência daquela não importará, de per si, na atribuição da qualidade de associado ao adquirente ou ao herdeiro, salvo disposição diversa do estatuto.

Art. 57 - A exclusão do associado só é admissível havendo justa causa, obedecido o disposto no estatuto; sendo este omisso, poderá também ocorrer se for reconhecida a existência de motivos graves, em deliberação fundamentada, pela maioria absoluta dos presentes à assembléia geral especialmente convocada para esse fim.

Parágrafo único - Da decisão do órgão que, de conformidade com o estatuto, decretar a exclusão, caberá sempre recurso à assembléia geral.

Art. 58 - Nenhum associado poderá ser impedido de exercer direito ou função que lhe tenha sido legitimamente conferido, a não ser nos casos e pela forma previstos na lei ou no estatuto.

Art. 59 - Compete privativamente à assembléia geral:

I - eleger os administradores;

II - destituir os administradores;

III - excluído.

III - aprovar as contas;

IV - excluído.

IV - alterar o estatuto.

Parágrafo único - Para as deliberações a que se referem os incisos II e IV é exigido o voto concorde de dois terços dos presentes à assembléia especialmente convocada para esse fim, não podendo ela deliberar, em primeira convocação, sem a maioria absoluta dos associados, ou com menos de um terço nas convocações seguintes.

Art. 60 - A convocação da assembléia geral far-se-á na forma do estatuto, garantido a um quinto dos associados o direito de promovê-la.

Art. 61 - Dissolvida a associação, o remanescente do seu patrimônio líquido, depois de deduzidas, se for o caso, as quotas ou frações ideais referidas no parágrafo único do art. 56, será destinado à entidade de fins não econômicos designada no estatuto, ou, omisso este, por deliberação dos associados, à instituição municipal, estadual ou federal, de fins idênticos ou semelhantes.

§ 1º - Por cláusula do estatuto ou, no seu silêncio, por deliberação dos associados, podem estes, antes da destinação do remanescente referida neste artigo, receber em restituição, atualizado o respectivo valor, as contribuições que tiverem prestado ao patrimônio da associação.

§ 2º - Não existindo no Município, no Estado, no Distrito Federal ou no Território, em que a associação tiver sede, instituição nas condições indicadas neste artigo, o que remanescer do seu patrimônio se devolverá à Fazenda do Estado, do Distrito Federal ou da União.

CAPÍTULO III

Das Fundações

Art. 62 - Para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la.

Parágrafo único - A fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência.

Art. 63 - Quando insuficientes para constituir a fundação, os bens a ela destinados serão, se de outro modo não dispuser o instituidor, incorporados em outra fundação que se proponha a fim igual ou semelhante.

Art. 64 - Constituída a fundação por negócio jurídico entre vivos, o instituidor é obrigado a transferir-lhe a propriedade, ou outro direito real, sobre os bens dotados, e, se não o fizer, serão registrados, em nome dela, por mandado judicial.

Art. 65 - Aqueles a quem o instituidor cometer a aplicação do patrimônio, em tendo ciência do encargo, formularão logo, de acordo com as suas bases (art. 62), o estatuto da fundação projetada, submetendo-o, em seguida, à aprovação da autoridade competente, com recurso ao juiz.

Parágrafo único - Se o estatuto não for elaborado no prazo assinado pelo instituidor, ou, não havendo prazo, em cento e oitenta dias, a incumbência caberá ao Ministério Público.

Art. 66 - Velará pelas fundações o Ministério Público do Estado onde situadas.

§ 1º - Se funcionarem no Distrito Federal, ou em Território, caberá o encargo ao Ministério Público Federal.

§ 2º - Se estenderem a atividade por mais de um Estado, caberá o encargo, em cada um deles, ao respectivo Ministério Público.

Art. 67 - Para que se possa alterar o estatuto da fundação é mister que a reforma:

I - seja deliberada por dois terços dos competentes para gerir e representar a fundação;

II - não contrarie ou desvirtue o fim desta;

III - seja aprovada pelo órgão do Ministério Público, e, caso este a denegue, poderá o juiz supri-la, a requerimento do interessado.

Art. 68 - Quando a alteração não houver sido aprovada por votação unânime, os administradores da fundação, ao submeterem o estatuto ao órgão do Ministério Público, requererão que se dê ciência à minoria vencida para impugná-la, se quiser, em dez dias.

Art. 69 - Tornando-se ilícita, impossível ou inútil a finalidade a que visa a fundação, ou vencido o prazo de sua existência, o órgão do Ministério Público, ou qualquer interessado, lhe promoverá a extinção, incorporando-se o seu patrimônio, salvo disposição em contrário no ato constitutivo, ou no estatuto, em outra fundação, designada pelo juiz, que se proponha a fim igual ou semelhante.

TÍTULO III

Do Domicílio

Art. 70 - O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo definitivo.

Art. 71 - Se, porém, a pessoa natural tiver diversas residências, onde, alternadamente, viva, considerar-se-á domicílio seu qualquer delas.

Art. 72 - É também domicílio da pessoa natural, quanto às relações concernentes à profissão, o lugar onde esta é exercida.

Parágrafo único - Se a pessoa exercitar profissão em lugares diversos, cada um deles constituirá domicílio para as relações que lhe corresponderem.

Art. 73 - Ter-se-á por domicílio da pessoa natural, que não tenha residência habitual, o lugar onde for encontrada.

Art. 74 - Muda-se o domicílio, transferindo a residência, com a intenção manifesta de o mudar.

Parágrafo único - A prova da intenção resultará do que declarar a pessoa às municipalidades dos lugares, que deixa, e para onde vai, ou, se tais declarações não fizer, da própria mudança, com as circunstâncias que a acompanharem.

Art. 75 - Quanto às pessoas jurídicas, o domicílio é:

I - da União, o Distrito Federal;

II - dos Estados e Territórios, as respectivas capitais;

III - do Município, o lugar onde funcione a administração municipal;

IV - das demais pessoas jurídicas, o lugar onde funcionarem as respectivas diretorias e administrações, ou onde elegerem domicílio especial no seu estatuto ou atos constitutivos.

§ 1º - Tendo a pessoa jurídica diversos estabelecimentos em lugares diferentes, cada um deles será considerado domicílio para os atos nele praticados.

§ 2º - Se a administração, ou diretoria, tiver a sede no estrangeiro, haver-se-á por domicílio da pessoa jurídica, no tocante às obrigações contraídas por cada uma das suas agências, o lugar do estabelecimento, sito no Brasil, a que ela corresponder.

Art. 76 - Têm domicílio necessário o incapaz, o servidor público, o militar, o marítimo e o preso.

Parágrafo único - O domicílio do incapaz é o do seu representante ou assistente; o do servidor público, o lugar em que exercer permanentemente suas funções; o do militar, onde servir, e, sendo da Marinha ou da Aeronáutica, a sede do comando a que se encontrar imediatamente subordinado; o do marítimo, onde o navio estiver matriculado; e o do preso, o lugar em que cumprir a sentença.

Art. 77 - O agente diplomático do Brasil, que, citado no estrangeiro, alegar extraterritorialidade sem designar onde tem, no país, o seu domicílio, poderá ser demandado no Distrito Federal ou no último ponto do território brasileiro onde o teve.

Art. 78 - Nos contratos escritos, poderão os contratantes especificar domicílio onde se exercitem e cumpram os direitos e obrigações deles resultantes.

LIVRO II

DOS BENS

TÍTULO ÚNICO

Das Diferentes Classes de Bens

CAPÍTULO I

Dos Bens Considerados em Si Mesmos

Seção I

Dos Bens Imóveis

Art. 79 - São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente.

Art. 80 - Consideram-se imóveis para os efeitos legais:

I - os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram;

II - o direito à sucessão aberta.

Art. 81 - Não perdem o caráter de imóveis:

I - as edificações que, separadas do solo, mas conservando a sua unidade, forem removidas para outro local;

II - os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se reempregarem.

Seção II

Dos Bens Móveis

Art. 82 - São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social.

Art. 83 - Consideram-se móveis para os efeitos legais:

I - as energias que tenham valor econômico;

II - os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes;

III - os direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações.

Art. 84 - Os materiais destinados a alguma construção, enquanto não forem empregados, conservam sua qualidade de móveis; readquirem essa qualidade os provenientes da demolição de algum prédio.

Seção III

Dos Bens Fungíveis e Consumíveis

Art. 85 - São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade.

Art. 86 - São consumíveis os bens móveis cujo uso importa destruição imediata da própria substância, sendo também considerados tais os destinados à alienação.

Seção IV

Dos Bens Divisíveis

Art. 87 - Bens divisíveis são os que se podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que se destinam.

Art. 88 - Os bens naturalmente divisíveis podem tornar-se indivisíveis por determinação da lei ou por vontade das partes.

Seção V

Dos Bens Singulares e Coletivos

Art. 89 - São singulares os bens que, embora reunidos, se consideram de per si, independentemente dos demais.

Art. 90 - Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária.

Parágrafo único - Os bens que formam essa universalidade podem ser objeto de relações jurídicas próprias.

Art. 91 - Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico.

CAPÍTULO II

Dos Bens Reciprocamente Considerados

Art. 92 - Principal é o bem que existe sobre si, abstrata ou concretamente; acessório, aquele cuja existência supõe a do principal.

Art. 93 - São pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro.

Art. 94 - Os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das circunstâncias do caso.

Art. 95 - Apesar de ainda não separados do bem principal, os frutos e produtos podem ser objeto de negócio jurídico.

Art. 96 - As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias.

§ 1º - São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor.

§ 2º - São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem.

§ 3º - São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore.

Art. 97 - Não se consideram benfeitorias os melhoramentos ou acréscimos sobrevindos ao bem sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor.

CAPÍTULO III

Dos Bens Públicos

Art. 98 - São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem.

Art. 99 - São bens públicos:

I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;

II - os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias;

III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.

Parágrafo único - Não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado.

Art. 100 - Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar.

Art. 101 - Os bens públicos dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei.

Art. 102 - Os bens públicos não estão sujeitos a usucapião.

Art. 103 - O uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração pertencerem.

LIVRO III

DOS FATOS JURÍDICOS

TÍTULO I

Do Negócio Jurídico

CAPÍTULO I

Disposições Gerais

Art. 104 - A validade do negócio jurídico requer:

I - agente capaz;

II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;

III - forma prescrita ou não defesa em lei.

Art. 105 - A incapacidade relativa de uma das partes não pode ser invocada pela outra em benefício próprio, nem aproveita aos co-interessados capazes, salvo se, neste caso, for indivisível o objeto do direito ou da obrigação comum.

Art. 106 - A impossibilidade inicial do objeto não invalida o negócio jurídico se for relativa, ou se cessar antes de realizada a condição a que ele estiver subordinado.

Art. 107 - A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.

Art. 108 - Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Art. 109 - No negócio jurídico celebrado com a cláusula de não valer sem instrumento público, este é da substância do ato.

Art. 110 - A manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento.

Art. 111 - O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa.

Art. 112 - Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.

Art. 113 - Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.

Art. 114 - Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente.

CAPÍTULO II

Da Representação

Art. 115 - Os poderes de representação conferem-se por lei ou pelo interessado.

Art. 116 - A manifestação de vontade pelo representante, nos limites de seus poderes, produz efeitos em relação ao representado.

Art. 117 - Salvo se o permitir a lei ou o representado, é anulável o negócio jurídico que o representante, no seu interesse ou por conta de outrem, celebrar consigo mesmo.

Parágrafo único - Para esse efeito, tem-se como celebrado pelo representante o negócio realizado por aquele em quem os poderes houverem sido subestabelecidos.

Art. 118 - O representante é obrigado a provar às pessoas, com quem tratar em nome do representado, a sua qualidade e a extensão de seus poderes, sob pena de, não o fazendo, responder pelos atos que a estes excederem.

Art. 119 - É anulável o negócio concluído pelo representante em conflito de interesses com o representado, se tal fato era ou devia ser do conhecimento de quem com aquele tratou.

Parágrafo único - É de cento e oitenta dias, a contar da conclusão do negócio ou da cessação da incapacidade, o prazo de decadência para pleitear-se a anulação prevista neste artigo.

Art. 120 - Os requisitos e os efeitos da representação legal são os estabelecidos nas normas respectivas; os da representação voluntária são os da Parte Especial deste Código.

CAPÍTULO III

Da Condição, do Termo e do Encargo

Art. 121 - Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.

Art. 122 - São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes.

Art. 123 - Invalidam os negócios jurídicos que lhes são subordinados:

I - as condições física ou juridicamente impossíveis, quando suspensivas;

II - as condições ilícitas, ou de fazer coisa ilícita;

III - as condições incompreensíveis ou contraditórias.

Art. 124 - Têm-se por inexistentes as condições impossíveis, quando resolutivas, e as de não fazer coisa impossível.

Art. 125 - Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição suspensiva, enquanto esta se não verificar, não se terá adquirido o direito, a que ele visa.

Art. 126 - Se alguém dispuser de uma coisa sob condição suspensiva, e, pendente esta, fizer quanto àquela novas disposições, estas não terão valor, realizada a condição, se com ela forem incompatíveis.

Art. 127 - Se for resolutiva a condição, enquanto esta se não realizar, vigorará o negócio jurídico, podendo exercer-se desde a conclusão deste o direito por ele estabelecido.

Art. 128 - Sobrevindo a condição resolutiva, extingue-se, para todos os efeitos, o direito a que ela se opõe; mas, se aposta a um negócio de execução continuada ou periódica, a sua realização, salvo disposição em contrário, não tem eficácia quanto aos atos já praticados, desde que compatíveis com a natureza da condição pendente e conforme aos ditames de boa-fé.

Art. 129 - Reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a condição cujo implemento for maliciosamente obstado pela parte a quem desfavorecer, considerando-se, ao contrário, não verificada a condição maliciosamente levada a efeito por aquele a quem aproveita o seu implemento.

Art. 130 - Ao titular do direito eventual, nos casos de condição suspensiva ou resolutiva, é permitido praticar os atos destinados a conservá-lo.

Art. 131 - O termo inicial suspende o exercício, mas não a aquisição do direito.

Art. 132 - Salvo disposição legal ou convencional em contrário, computam-se os prazos, excluído o dia do começo, e incluído o do vencimento.

§ 1º - Se o dia do vencimento cair em feriado, considerar-se-á prorrogado o prazo até o seguinte dia útil.

§ 2º - Meado considera-se, em qualquer mês, o seu décimo quinto dia.

§ 3º - Os prazos de meses e anos expiram no dia de igual número do de início, ou no imediato, se faltar exata correspondência.

§ 4º - Os prazos fixados por hora contar-se-ão de minuto a minuto.

Art. 133 - Nos testamentos, presume-se o prazo em favor do herdeiro, e, nos contratos, em proveito do devedor, salvo, quanto a esses, se do teor do instrumento, ou das circunstâncias, resultar que se estabeleceu a benefício do credor, ou de ambos os contratantes.

Art. 134 - Os negócios jurídicos entre vivos, sem prazo, são exeqüíveis desde logo, salvo se a execução tiver de ser feita em lugar diverso ou depender de tempo.

Art. 135 - Ao termo inicial e final aplicam-se, no que couber, as disposições relativas à condição suspensiva e resolutiva.

Art. 136 - O encargo não suspende a aquisição nem o exercício do direito, salvo quando expressamente imposto no negócio jurídico, pelo disponente, como condição suspensiva.

Art. 137 - Considera-se não escrito o encargo ilícito ou impossível, salvo se constituir o motivo determinante da liberalidade, caso em que se invalida o negócio jurídico.

CAPÍTULO IV

Dos Defeitos do Negócio Jurídico

Seção I

Do Erro ou Ignorância

Art. 138 - São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio.

Art. 139 - O erro é substancial quando:

I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais;

II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante;

III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico.

Art. 140 - O falso motivo só vicia a declaração de vontade quando expresso como razão determinante.

Art. 141 - A transmissão errônea da vontade por meios interpostos é anulável nos mesmos casos em que o é a declaração direta.

Art. 142 - O erro de indicação da pessoa ou da coisa, a que se referir a declaração de vontade, não viciará o negócio quando, por seu contexto e pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou pessoa cogitada.

Art. 143 - O erro de cálculo apenas autoriza a retificação da declaração de vontade.

Art. 144 - O erro não prejudica a validade do negócio jurídico quando a pessoa, a quem a manifestação de vontade se dirige, se oferecer para executá-la na conformidade da vontade real do manifestante.

Seção II

Do Dolo

Art. 145 - São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa.

Art. 146 - O dolo acidental só obriga à satisfação das perdas e danos, e é acidental quando, a seu despeito, o negócio seria realizado, embora por outro modo.

Art. 147 - Nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se teria celebrado.

Art. 148 - Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a parte a quem aproveite dele tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou.

Art. 149 - O dolo do representante legal de uma das partes só obriga o representado a responder civilmente até a importância do proveito que teve; se, porém, o dolo for do representante convencional, o representado responderá solidariamente com ele por perdas e danos.

Art. 150 - Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio, ou reclamar indenização.

Seção III

Da Coação

Art. 151 - A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.

Parágrafo único - Se disser respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz, com base nas circunstâncias, decidirá se houve coação.

Art. 152 - No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela.

Art. 153 - Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor reverencial.

Art. 154 - Vicia o negócio jurídico a coação exercida por terceiro, se dela tivesse ou devesse ter conhecimento a parte a que aproveite, e esta responderá solidariamente com aquele por perdas e danos.

Art. 155 - Subsistirá o negócio jurídico, se a coação decorrer de terceiro, sem que a parte a que aproveite dela tivesse ou devesse ter conhecimento; mas o autor da coação responderá por todas as perdas e danos que houver causado ao coacto.

Seção IV

Do Estado de Perigo

Art. 156 - Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa.

Parágrafo único - Tratando-se de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias.

Seção V

Da Lesão

Art. 157 - Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.

§ 1º - Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico.

§ 2º - Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.

Seção VI

Da Fraude Contra Credores

Art. 158 - Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos.

§ 1º - Igual direito assiste aos credores cuja garantia se tornar insuficiente.

§ 2º - Só os credores que já o eram ao tempo daqueles atos podem pleitear a anulação deles.

Art. 159 - Serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante.

Art. 160 - Se o adquirente dos bens do devedor insolvente ainda não tiver pago o preço e este for, aproximadamente, o corrente, desobrigar-se-á depositando-o em juízo, com a citação de todos os interessados.

Parágrafo único - Se inferior, o adquirente, para conservar os bens, poderá depositar o preço que lhes corresponda ao valor real.

Art. 161 - A ação, nos casos dos arts. 158 e 159, poderá ser intentada contra o devedor insolvente, a pessoa que com ele celebrou a estipulação considerada fraudulenta, ou terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé.

Art. 162 - O credor quirografário, que receber do devedor insolvente o pagamento da dívida ainda não vencida, ficará obrigado a repor, em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores, aquilo que recebeu.

Art. 163 - Presumem-se fraudatórias dos direitos dos outros credores as garantias de dívidas que o devedor insolvente tiver dado a algum credor.

Art. 164 - Presumem-se, porém, de boa-fé e valem os negócios ordinários indispensáveis à manutenção de estabelecimento mercantil, rural, ou industrial, ou à subsistência do devedor e de sua família.

Art. 165 - Anulados os negócios fraudulentos, a vantagem resultante reverterá em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores.

Parágrafo único - Se esses negócios tinham por único objeto atribuir direitos preferenciais, mediante hipoteca, penhor ou anticrese, sua invalidade importará somente na anulação da preferência ajustada.

CAPÍTULO V

Da Invalidade do Negócio Jurídico

Art. 166 - É nulo o negócio jurídico quando:

I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;

II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;

IV - não revestir a forma prescrita em lei;

V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;

VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;

VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.

Art. 167 - É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.

§ 1º - Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:

I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;

II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;

III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.

§ 2º - Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico simulado.

Art. 168 - As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

Parágrafo único - As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Art. 169 - O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.

Art. 170 - Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade.

Art. 171 - Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico:

I - por incapacidade relativa do agente;

II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.

Art. 172 - O negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito de terceiro.

Art. 173 - O ato de confirmação deve conter a substância do negócio celebrado e a vontade expressa de mantê-lo.

Art. 174 - É escusada a confirmação expressa, quando o negócio já foi cumprido em parte pelo devedor, ciente do vício que o inquinava.

Art. 175 - A confirmação expressa, ou a execução voluntária de negócio anulável, nos termos dos arts. 172 a 174, importa a extinção de todas as ações, ou exceções, de que contra ele dispusesse o devedor.

Art. 176 - Quando a anulabilidade do ato resultar da falta de autorização de terceiro, será validado se este a der posteriormente.

Art. 177 - A anulabilidade não tem efeito antes de julgada por sentença, nem se pronuncia de ofício; só os interessados a podem alegar, e aproveita exclusivamente aos que a alegarem, salvo o caso de solidariedade ou indivisibilidade.

Art. 178 - É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado:

I - no caso de coação, do dia em que ela cessar;

II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio jurídico;

III - no de atos de incapazes, do dia em que cessar a incapacidade.

Art. 179 - Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato.

Art. 180 - O menor, entre dezesseis e dezoito anos, não pode, para eximir-se de uma obrigação, invocar a sua idade se dolosamente a ocultou quando inquirido pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, declarou-se maior.

Art. 181 - Ninguém pode reclamar o que, por uma obrigação anulada, pagou a um incapaz, se não provar que reverteu em proveito dele a importância paga.

Art. 182 - Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente.

Art. 183 - A invalidade do instrumento não induz a do negócio jurídico sempre que este puder provar-se por outro meio.

Art. 184 - Respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio jurídico não o prejudicará na parte válida, se esta for separável; a invalidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a destas não induz a da obrigação principal.

TÍTULO II

Dos Atos Jurídicos Lícitos

Art. 185 - Aos atos jurídicos lícitos, que não sejam negócios jurídicos, aplicam-se, no que couber, as disposições do Título anterior.

TÍTULO III

Dos Atos Ilícitos

Art. 186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187 - Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Art. 188 - Não constituem atos ilícitos:

I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido;

II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.

Parágrafo único - No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.

TÍTULO IV

Da Prescrição e da Decadência

CAPÍTULO I

Da Prescrição

Seção I

Disposições Gerais

Art. 189 - Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.

Art. 190 - A exceção prescreve no mesmo prazo em que a pretensão.

Art. 191 - A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição.

Art. 192 - Os prazos de prescrição não podem ser alterados por acordo das partes.

Art. 193 - A prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem aproveita.

Art. 194 - O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz.

Art. 195 - Os relativamente incapazes e as pessoas jurídicas têm ação contra os seus assistentes ou representantes legais, que derem causa à prescrição, ou não a alegarem oportunamente.

Art. 196 - A prescrição iniciada contra uma pessoa continua a correr contra o seu sucessor.

Seção II

Das Causas que Impedem ou Suspendem a Prescrição

Art. 197 - Não corre a prescrição:

I - entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal;

II - entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar;

III - entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela.

Art. 198 - Também não corre a prescrição:

I - contra os incapazes de que trata o art. 3º;

II - contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios;

III - contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra.

Art. 199 - Não corre igualmente a prescrição:

I - pendendo condição suspensiva;

II - não estando vencido o prazo;

III - pendendo ação de evicção.

Art. 200 - Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva.

Art. 201 - Suspensa a prescrição em favor de um dos credores solidários, só aproveitam os outros se a obrigação for indivisível.

Seção III

Das Causas que Interrompem a Prescrição

Art. 202 - A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:

I - por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;

II - por protesto, nas condições do inciso antecedente;

III - por protesto cambial;

IV - pela apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em concurso de credores;

V - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;

VI - por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor.

Parágrafo único - A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper.

Art. 203 - A prescrição pode ser interrompida por qualquer interessado.

Art. 204 - A interrupção da prescrição por um credor não aproveita aos outros; semelhantemente, a interrupção operada contra o co-devedor, ou seu herdeiro, não prejudica aos demais coobrigados.

§ 1º - A interrupção por um dos credores solidários aproveita aos outros; assim como a interrupção efetuada contra o devedor solidário envolve os demais e seus herdeiros.

§ 2º - A interrupção operada contra um dos herdeiros do devedor solidário não prejudica os outros herdeiros ou devedores, senão quando se trate de obrigações e direitos indivisíveis.

§ 3º - A interrupção produzida contra o principal devedor prejudica o fiador.

Seção IV

Dos Prazos da Prescrição

Art. 205 - A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.

Art. 206 - Prescreve:

§ 1º - Em um ano:

I - a pretensão dos hospedeiros ou fornecedores de viveres destinados a consumo no próprio estabelecimento, para o pagamento da hospedagem ou dos alimentos;

II - a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo:

a) para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data em que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador;

b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão;

III - a pretensão dos tabeliães, auxiliares da justiça, serventuários judiciais, árbitros e peritos, pela percepção de emolumentos, custas e honorários;

IV - a pretensão contra os peritos, pela avaliação dos bens que entraram para a formação do capital de sociedade anônima, contado da publicação da ata da assembléia que aprovar o laudo;

V - a pretensão dos credores não pagos contra os sócios ou acionistas e os liquidantes, contado o prazo da publicação da ata de encerramento da liquidação da sociedade.

§ 2º - Em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a partir da data em que se vencerem.

§ 3º - Em três anos:

I - a pretensão relativa a aluguéis de prédios urbanos ou rústicos;

II - a pretensão para receber prestações vencidas de rendas temporárias ou vitalícias;

III - a pretensão para haver juros, dividendos ou quaisquer prestações acessórias, pagáveis, em períodos não maiores de um ano, com capitalização ou sem ela;

IV - a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;

V - a pretensão de reparação civil;

VI - a pretensão de restituição dos lucros ou dividendos recebidos de má-fé, correndo o prazo da data em que foi deliberada a distribuição;

VII - a pretensão contra as pessoas em seguida indicadas por violação da lei ou do estatuto, contado o prazo:

a) para os fundadores, da publicação dos atos constitutivos da sociedade anônima;

b) para os administradores, ou fiscais, da apresentação, aos sócios, do balanço referente ao exercício em que a violação tenha sido praticada, ou da reunião ou assembléia geral que dela deva tomar conhecimento;

c) para os liquidantes, da primeira assembléia semestral posterior à violação;

VIII - a pretensão para haver o pagamento de título de crédito, a contar do vencimento, ressalvadas as disposições de lei especial;

IX - a pretensão do beneficiário contra o segurador, e a do terceiro prejudicado, no caso de seguro de responsabilidade civil obrigatório.

§ 4º - Em quatro anos, a pretensão relativa à tutela, a contar da data da aprovação das contas.

§ 5º - Em cinco anos:

I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular;

II - a pretensão dos profissionais liberais em geral, procuradores judiciais, curadores e professores pelos seus honorários, contado o prazo da conclusão dos serviços, da cessação dos respectivos contratos ou mandato;

III - a pretensão do vencedor para haver do vencido o que despendeu em juízo.

CAPÍTULO II

Da Decadência

Art. 207 - Salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição.

Art. 208 - Aplica-se à decadência o disposto nos arts. 195 e 198, inciso I.

Art. 209 - É nula a renúncia à decadência fixada em lei.

Art. 210 - Deve o juiz, de ofício, conhecer da decadência, quando estabelecida por lei.

Art. 211 - Se a decadência for convencional, a parte a quem aproveita pode alegá-la em qualquer grau de jurisdição, mas o juiz não pode suprir a alegação.

TÍTULO V

Da Prova

Art. 212 - Salvo o negócio a que se impõe forma especial, o fato jurídico pode ser provado mediante:

I - confissão;

II - documento;

III - testemunha;

IV - presunção;

V - perícia.

Art. 213 - Não tem eficácia a confissão se provém de quem não é capaz de dispor do direito a que se referem os fatos confessados.

Parágrafo único - Se feita a confissão por um representante, somente é eficaz nos limites em que este pode vincular o representado.

Art. 214 - A confissão é irrevogável, mas pode ser anulada se decorreu de erro de fato ou de coação.

Art. 215 - A escritura pública, lavrada em notas de tabelião, é documento dotado de fé pública, fazendo prova plena.

§ 1º - Salvo quando exigidos por lei outros requisitos, a escritura pública deve conter:

I - data e local de sua realização;

II - reconhecimento da identidade e capacidade das partes e de quantos hajam comparecido ao ato, por si, como representantes, intervenientes ou testemunhas;

III - nome, nacionalidade, estado civil, profissão, domicílio e residência das partes e demais comparecentes, com a indicação, quando necessário, do regime de bens do casamento, nome do outro cônjuge e filiação;

IV - manifestação clara da vontade das partes e dos intervenientes;

V - referência ao cumprimento das exigências legais e fiscais inerentes à legitimidade do ato;

VI - declaração de ter sido lida na presença das partes e demais comparecentes, ou de que todos a leram;

VII - assinatura das partes e dos demais comparecentes, bem como a do tabelião ou seu substituto legal, encerrando o ato.

§ 2º - Se algum comparecente não puder ou não souber escrever, outra pessoa capaz assinará por ele, a seu rogo.

§ 3º - A escritura será redigida na língua nacional.

§ 4º - Se qualquer dos comparecentes não souber a língua nacional e o tabelião não entender o idioma em que se expressa, deverá comparecer tradutor público para servir de intérprete, ou, não o havendo na localidade, outra pessoa capaz que, a juízo do tabelião, tenha idoneidade e conhecimento bastantes.

§ 5º - Se algum dos comparecentes não for conhecido do tabelião, nem puder identificar-se por documento, deverão participar do ato pelo menos duas testemunhas que o conheçam e atestem sua identidade.

Art. 216 - Farão a mesma prova que os originais as certidões textuais de qualquer peça judicial, do protocolo das audiências, ou de outro qualquer livro a cargo do escrivão, sendo extraídas por ele, ou sob a sua vigilância, e por ele subscritas, assim como os traslados de autos, quando por outro escrivão consertados.

Art. 217 - Terão a mesma força probante os traslados e as certidões, extraídos por tabelião ou oficial de registro, de instrumentos ou documentos lançados em suas notas.

Art. 218 - Os traslados e as certidões considerar-se-ão instrumentos públicos, se os originais se houverem produzido em juízo como prova de algum ato.

Art. 219 - As declarações constantes de documentos assinados presumem-se verdadeiras em relação aos signatários.

Parágrafo único - Não tendo relação direta, porém, com as disposições principais ou com a legitimidade das partes, as declarações enunciativas não eximem os interessados em sua veracidade do ônus de prová-las.

Art. 220 - A anuência ou a autorização de outrem, necessária à validade de um ato, provar-se-á do mesmo modo que este, e constará, sempre que se possa, do próprio instrumento.

Art. 221 - O instrumento particular, feito e assinado, ou somente assinado por quem esteja na livre disposição e administração de seus bens, prova as obrigações convencionais de qualquer valor; mas os seus efeitos, bem como os da cessão, não se operam, a respeito de terceiros, antes de registrado no registro público.

Parágrafo único - A prova do instrumento particular pode suprir-se pelas outras de caráter legal.

Art. 222 - O telegrama, quando lhe for contestada a autenticidade, faz prova mediante conferência com o original assinado.

Art. 223 - A cópia fotográfica de documento, conferida por tabelião de notas, valerá como prova de declaração da vontade, mas, impugnada sua autenticidade, deverá ser exibido o original.

Parágrafo único - A prova não supre a ausência do título de crédito, ou do original, nos casos em que a lei ou as circunstâncias condicionarem o exercício do direito à sua exibição.

Art. 224 - Os documentos redigidos em língua estrangeira serão traduzidos para o português para ter efeitos legais no País.

Art. 225 - As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhes impugnar a exatidão.

Art. 226 - Os livros e fichas dos empresários e sociedades provam contra as pessoas a que pertencem, e, em seu favor, quando, escriturados sem vício extrínseco ou intrínseco, forem confirmados por outros subsídios.

Parágrafo único - A prova resultante dos livros e fichas não é bastante nos casos em que a lei exige escritura pública, ou escrito particular revestido de requisitos especiais, e pode ser ilidida pela comprovação da falsidade ou inexatidão dos lançamentos.

Art. 227 - Salvo os casos expressos, a prova exclusivamente testemunhal só se admite nos negócios jurídicos cujo valor não ultrapasse o décuplo do maior salário mínimo vigente no País ao tempo em que foram celebrados.

Parágrafo único - Qualquer que seja o valor do negócio jurídico, a prova testemunhal é admissível como subsidiária ou complementar da prova por escrito.

Art. 228 - Não podem ser admitidos como testemunhas:

I - os menores de dezesseis anos;

II - aqueles que, por enfermidade ou retardamento mental, não tiverem discernimento para a prática dos atos da vida civil;

III - os cegos e surdos, quando a ciência do fato que se quer provar dependa dos sentidos que lhes faltam;

IV - o interessado no litígio, o amigo íntimo ou o inimigo capital das partes;

V - os cônjuges, os ascendentes, os descendentes e os colaterais, até o terceiro grau de alguma das partes, por consangüinidade, ou afinidade.

Parágrafo único - Para a prova de fatos que só elas conheçam, pode o juiz admitir o depoimento das pessoas a que se refere este artigo.

Art. 229 - Ninguém pode ser obrigado a depor sobre fato:

I - a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar segredo;

II - a que não possa responder sem desonra própria, de seu cônjuge, parente em grau sucessível, ou amigo íntimo;

III - que o exponha, ou às pessoas referidas no inciso antecedente, a perigo de vida, de demanda, ou de dano patrimonial imediato.

Art. 230 - As presunções, que não as legais, não se admitem nos casos em que a lei exclui a prova testemunhal.

Art. 231 - Aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessário não poderá aproveitar-se de sua recusa.

Art. 232 - A recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame.

04 dezembro 2020

29 novembro 2020

Miscigenação brasileira. SvH

 

Partidos Políticos desinteressados na verdade, criam preconceitos entre as pessoas criando falsos cognatos para fragmentar a sociedade brasileira que é super diversificada e miscigenada desde 1.500. Não caiam nessa. Não saiam por aí macaqueando países onde existiu o Apartheid. Deixem de ser manipulados. Afinal ninguém aqui é marionete, é?

Sonia von Homrich, 29 de Novembro de 2020

27 novembro 2020

Conceitos, Valores, Crenças, Cultura. Rudolf Frieling . SvH.

RENOVANDO CONCEITOS

Renovando Valores, Crenças, Alterando a Cultura. Rudolf Frieling

Desafios em compreender melhor o ser humano, diante do Bem e do Mal.

Tradução e Comentários por Sonia von Homrich - SvH Conflitos E Vida Counselling Consulting. Revisão 7 de Setembro de 2018

Sonia von Homrich, especialista em Conflitos, desde os Conflitos  individuais até os Corporativos e entre Nações. Especialista em Aconselhamento Espiritual com fundamentos na Ciência de Goethe-Rudolf Steiner (Psicanálise e Counselling),  Administradora de Empresas, atua através do Counselling, da Consultoria, Workshops e Artigos. Experiência Internacional em Mediação e Counselling em Conflitos.

 

O enigma do Ser Humano

A natureza do Cristianismo é inseparável da questão da natureza do homem.  A consciência moderna sente o “stress” crescente da questão: “O que é afinal ser um ser humano?”.   A existência humana não pode mais ser vista de forma óbvia e bem definida, assim é questionada, mais e mais.  Existe afinal de contas um significado para ser “humano”?  Quão frequentemente vemos o colapso das promessas dos milagres da infância e perecemos na rotina do mundo adulto – a promessa não cumprida não-redime.  Quanto mais nos detemos a observar vemos como o poder do pensamento humano resulta nas terríveis realidades do gás venenoso, nas armas químicas e biológicas e na bomba atômica, enquanto um poder emocional não direcionado excursiona na ganância e no ódio.  “O avião de Santos Dumont inventor ao invés de unir pessoas, como era o seu desejo, serve a arte da guerra”.  Somos testemunhas diárias de tragédias resultantes desta nossa inabilidade de viver juntos, em paz, em todos os níveis: povos, raças, classes sociais, vizinhos, famílias, casamentos. “Isso sem nem mesmo considerar a batalha individual para viver, sobreviver”.  Na verdade, todos nós já vivenciamos um sinal interior súbito que anuncia o pensamento: “Como o mundo seria lindo sem pessoas!” Todos conhecemos a história dos prodígios da criação do Brasil, numa piada bem humorada, com a observação depreciativa por parte de Deus ao seu Anjo: “Ah, mas o povinho que eu vou colocar ali…” Muitas pessoas em vários lugares do mundo atual consideram que o mundo seria bem melhor sem pessoas, a natureza seria melhor sem pessoas, a ecologia.

Colocando estas observações de outra forma: “Quão lindo o mundo poderia ser sem a sua criação coroada!”  Essa afirmação aparentemente paradoxal nos confronta, ficamos cara a cara com os enigmas da existência humana.  Que tipo de criatura peculiar é essa que por um lado é um milagre da criação divina e ao mesmo tempo é a mais maldosa e terrível criatura dentre todas as bestas selvagens?  Não existe mesmo algo muito errado no próprio ser humano? Como ver sentido nestas contradições? “Quantas vezes me foi perguntado em minha infância se o homem nascia bom e a sociedade o corrompia ou se o homem não nascia bom...”  É exatamente neste nosso árduo trabalho para dar sentido a estes enigmas que estão sempre a nos cutucar e oprimir que se nos oferece a maturidade para reconhecer e aceitar a “cristologia”.  Como seres modernos estamos aptos a olhar a cristologia com novos olhos e com o que há de melhor de nossa consciência intelectual e espiritual.  Devemos à ciência de Goethe-Steiner também chamada de Antroposofia  (Sabedoria do Homem, do Ser Humano) ou Ciência Espiritual, o fato de estarmos aptos a ver a cristologia em toda a sua grandeza e como a mais decisiva relação para com a humanidade. Este corpo de conhecimento tornou-se disponível para nós através de Rudolf Steiner.

Embora o Cristianismo tenha entrado nas páginas da história apenas num determinado momento histórico, devemos ver a Cristologia num contexto bem mais amplo.  Desde o seu início, a Cristologia  incluiu em sua visão o mundo de sabedoria das eras passadas como é preservado nas páginas do Velho Testamento.  Vamos primeiro dirigir nossa atenção para a pré-história da Cristandade.

A criação do Homem

A sabedoria antiga da história bíblica da criação vê o ser humano como originado na pureza do mundo divino.  Essa sabedoria fala de uma intenção definida, um objetivo específico que se coloca diante do mundo divino quando este traz o ser humano à existência. Deus criou o Homem (homem/mulher) “à sua própria imagem”. Semelhante a Deus,  este era o grande objetivo, o objetivo valorizado por Deus, o qual irradiou totalmente sobre a criação do Homem.

No que consiste essa semelhança com Deus?  Fosse o ser humano mais uma criatura, mais um produto da criação, não obstante ser ou não uma quase-perfeita criação, esta realização ainda não faria justiça ao objetivo exaltado na consagração do ser humano.  O ser humano mereceria ser chamado de imagem de Deus se ele também fosse um ser criativo, assim, algo além do que apenas ser um produto da criação. O ser humano está em harmonia com o propósito divino apenas e somente quando ele interpenetra em si esta sua própria criatividade, no centro pessoal de seu ser, a partir desta essência, deve agir em liberdade e amor, mantendo-se na companhia da bondade divina. Um ser assim livre e autodeterminado, uma “individualidade” no melhor sentido da palavra, não pode simplesmente aparecer (na linguagem de hoje) como um “produto acabado” das mãos de Deus.  Um ser destes não pode simplesmente ser feito -  se é para ser mais do que uma simples criatura-criada. Por esta razão, Deus respirou (insuflou) no ser humano algo de sua própria natureza divina. Para usar outra imagem, Deus ofereceu ao ser humano uma centelha de seu próprio divino, o fogo primordial, o qual através do sacrifício foi colocado como uma semente no ser humano.

Um longo processo de desenvolvimento é necessário para que esta semente possa um dia desenvolver-se em uma individualidade livre e à imagem de Deus.  A fim de carregar estas suas capacidades não-nascidas, o ser humano prossegue através da evolução histórica.  O fato dele encontrar a si mesmo dentro de um processo histórico não é simplesmente algo arbitrário ou externo à sua natureza. Pelo contrário, faz parte integral de seu desenvolvimento. Somente sofrendo através de seu destino e moldando-o com equidade o ser humano gradualmente evolui para aquele estado que é o estado intencionado para ele.  É um insight de fundamental importância que neste ser humano, a imagem de Deus não está ainda completa.  Este ser humano é quem “está a caminho”, se coloca a caminho.  E nisto este ser se distingue de todas as criaturas que são as suas companheiras na Terra.  Pedras, plantas, animais são trabalhos terminados.  A rosa por exemplo, é na verdade 100% rosa.  É a expressão perfeita de seu propósito e potencial. Pela mesma razão, no entanto, a rosa não tem história.  O mesmo é verdadeiro para o animal. Em contraste com outras criaturas na natureza, cada uma completa em sua própria maneira, o ser humano é perseguido pela dolorosa consciência da sua própria imperfeição.  Ele é altamente superior comparado às criaturas abaixo dele e mesmo assim,  com respeito ao seu próprio nível de perfeição, ele está terrivelmente atrás.  Como ser humano, ele não está tão perfeito quanto a rosa,  que é uma rosa.  Naturalmente, o ser humano sem dúvida é o coroamento da criação, no que concerne à sua forma em toda a sua extensão.  Através de uma longa história de desenvolvimento a forma do corpo humano atingiu um alto grau de perfeição. Mas a verdadeira natureza interior do ser humano está ainda em seu início. Daí ser tão difícil chegar a uma resposta clara para esta questão da verdadeira natureza do ser humano e o seu problema último  - o conflito de seu valor ou não-valor.  A palavra final ainda não foi dada. O processo do desenvolvimento humano ainda está se desenrolando. Compreendemos a nós mesmos com propriedade ao dizermos que ainda não somos “seres humanos” no verdadeiro sentido da palavra,  mas sim tendemos mais a ser algo para o qual uma nova palavra deva ser criada, nós  “demandamos” (reivindicamos), nós somos “aspirantes” (pretendentes) à palavra, “ser humano”.  O ser humano, à imagem de Deus,  é um objetivo distante.  O caminho que leva a este objetivo é a história.

A perda do Paraíso

Dentre as forças que trabalham no desenvolvimento histórico está também o Poder que se opõe ao plano divino.  O ser humano abriga dentro dele a possibilidade do mal, possibilidade esta que com frequência, sempre  encontra sua expressão no mundo.  É extremamente interessante notar que o ser humano sente o mal em si como algo fora dele, externo a ele, como se, em termos fundamentais fosse alienado à sua própria natureza, a despeito do fato que este mal pode exercer um enorme poder sobre o homem dado num momento determinado.  Quando permitimos que estas forças alienígenas do mal trabalhem dentro de nós, nós falamos que   “nos permitimos nos soltar, nos entregar” , na realidade nestes casos, não conhecemos a nós mesmos (mesmo quando usando a justificativa  “nós somos assim mesmo”).  Cada um de nós em sua natureza verdadeiramente gostaria de ser “bom” mesmo quando não queremos admiti-lo.

Este sentimento elementar que o mal é algo estrangeiro em mim, não fazendo parte de meu verdadeiro ser, confirma a visão da tradição bíblica na qual o mal não reside no homem desde o início mas entrou nele somente num específico momento do tempo.  Naquele dado momento entrou o mal no ser humano,  como uma influência estranha por assim dizer, como se pegássemos uma infecção na vida-da-alma.  A Bíblia descreve este evento como a “Queda”, usando as imagens da “serpente”, da “árvore” e da “maçã”.  Naturalmente estas palavras são imagens.  Imagens que se apresentam a si mesmas com um significado à percepção suprassensível.  O ser humano atual precisa traduzir as imagens para os conceitos modernos se quiser perceber /compreender o que nelas vive em termos de verdades superiores.

Como pôde um Deus amado e sábio permitir que o poder do mal se aproximasse daquele ser humano inocente e ainda infantil, como em verdade o fez, infectando a sua alma com egoísmo e consequentemente  abrir caminho para toda a futura miséria do ser humano?   Assim, nós podemos começar a entender o porquê disto, ao nos recordarmos (todos sabemos bem esta lição!) que uma pessoa jovem não é ajudada em seu desenvolvimento através de permanecer constantemente sob a proteção de seus pais.  Querendo que este jovem se torne algo na vida, ele precisa se libertar desta proteção.  Os pais devem superar seus medos em suas míopes visões e permitir que seus jovens pisem fora,  no mundo hostil e perigoso.  Os perigos apenas serão tomados como uma parte do acordo. Um insight como este que ganhamos através das experiências de vida, pode nos oferecer a janela através da qual nós entramos  totalmente dentro dos segredos da história do homem. Começamos a sentir a qualidade do risco e do quanto é audacioso e desafiador, o plano divino para a humanidade.

A proximidade de Deus junto ao homem criado não permitiria que a verdadeira independência surgisse.  No seu estado original, este Homem (homem/mulher) assim como as suas ações,  não seriam mais nada além do bom. Mas a inocência do homem paradisíaco não era o estado-último intencionado para a humanidade.  Após a Queda, no Futuro, nossa inocência irá ser readquirida no futuro como santidade.  O ser humano só se tornará plenamente humano quando ele livremente desenvolver o bem a partir de sua natureza mais íntima e profunda.  Somente então o bem será verdadeiramente um bem.  Entre a inocência do Jardim do Éden e a inocência da santidade,  no entanto, reside o trágico envolvimento do Homem (homem/mulher) com a culpa.

Com a Queda iniciou a crescente alienação do ser humano com a sua origem divina. Ele tornou-se mais e mais independente. Como resultado de sua progressiva separação, o ser humano encontrou-se num ambiente crescentemente solidificado, endurecido.  Quanto mais físico seu corpo foi se formando,  mais ele se fechou para o mundo divino.

Isto propiciou o crescente isolamento do ser humano, seu ambiente tornou-se,  a cada período histórico,  cada vez mais sólido e terrestre, ensejando sua chance em dar seus primeiros passos na direção de uma existência independente.  Neste caminho, a Queda do ser humano inaugurou um longo processo que mesmo ainda hoje não alcançou o seu fim.  Mesmo hoje, a alienação de sua origem divina exige que ele vá através de muitas e muitas transformações ainda e da mesma forma essa alienação se intromete mais e mais em muitas áreas de sua existência.

Os antigos sonhos do perdido Éden, calcados em uma era de ouro perdida,  eram visionários. Nós temos que evitar criar o erro de conceber um  “paraíso perdido” num sentido tosco materialista.  Fazer isso é entrar em desentendimentos com a linguagem imaginativa dos antigos textos sagrados. Na verdade, aí residia a condição original da infância do ser humano, na inocente proximidade de Deus que ecoa na memória de todos os povos antigos.

Essa nossa “origem na luz”  é a fonte da revelação primordial a qual gradualmente feneceu e tornou-se obscura.  Brilha e reluz na sabedoria de todos os povos e pode ser reconhecida através todas as suas posteriores elaborações e disfarces. Neste contexto os conhecidos “mistérios da antiguidade”  também se incluem.  Nestes mistérios uma pessoa escolhida era conduzida através de uma “iniciação” que permitia que esta fosse levada até um determinado nível, superando sua alienação do mundo divino.  Os mistérios, tão extensamente   quanto possível,  tentavam reverter o processo da Queda. As antigas religiões pré-cristãs se originam nos ecos desta revelação primordial.  Não apenas em Israel, mas também nas religiões pagãs, existia uma grandiosa e profunda sabedoria aonde a Queda  manifestava a si mesma.   Os “deuses” pagãos eram seres de altas hierarquias espirituais – anjos, arcanjos e outros seres suprassensíveis – os quais revelavam o mundo divino,  ao ser humano. Houve um tempo no qual  o ser humano mantinha contato com eles.

Gradualmente, no entanto, o ser humano perdeu a habilidade de perceber aqueles poderes altíssimos. O lugar dos “deuses” foi frequentemente tomado por demônios e fantasmas. E por este caminho os próprios mistérios em sua maioria entraram em decadência.

Um mundo sem deuses

Com a mesma intensidade que o ser humano vivenciava este crepúsculo dos deuses e esquecia seu lar suprassensorial, ele pôde se sentir em casa na Terra e fez dela, cada vez mais seu lar.   Desta forma ele adquiriu uma grande consciência e a capacidade de estar alerta, mesmo considerando que o seu desenvolvimento se fazia à custa do paraíso.

O mundo terrestre tornou-se bastante semelhante a um vácuo, um espaço vazio dentro da divina presença totalmente abrangente.  Num sentido bem estrito, a Terra não caiu fora desta presença inteiramente.  Mas precisamos formar uma imagem mais viva da onipresença de Deus um conceito que muitas vezes permanece abstrato e sem um significado claro. Temos que expandir o nosso entendimento para ver como a onipresença pode conter graduações para mais e também, para menos.   Por exemplo, Deus está presente no criminoso, sustentando a sua própria existência de ser humano, minuto a minuto, da mesma forma que Ele se informa do crime cometido.  Deus está “mais claramente presente” num ato de bondade, num sentido muito diverso e numa graduação bem mais alta.  Nossas preces para a vinda de seu reino entre nós e para que a sua vontade na terra seja feita,  seriam totalmente desprovidas de significado,  se não existissem variações nos graus de sua presença.   É neste sentido da “diluída” presença divina que a terra pode ser chamada de vácuo, um local sem deuses.  No que diz respeito à consciência do ser humano, a presença de Deus pode ser reduzida além de qualquer possibilidade de reconhecimento, diluída até o ponto onde ela não pode mais ser nem ao menos sentida.   É neste vácuo que o ser humano desenvolve mais e mais independência.

É exatamente por esta razão que tantos horrores e abominações acontecem na terra.  Esta é a razão de Deus “permitir” tudo isso.  Sem a séria possibilidade do erro não existe nenhuma liberdade - em toda a sua extensão e amplitude - sem liberdade e independência não pode existir o verdadeiro amor.   O fato de Deus permanecer silencioso,  permitindo que estas coisas aconteçam,  fundamenta-se no que mais verdadeiramente se opõe a qualquer indiferença e desinteresse.  Na verdade é o mais que trágico lado oposto do mais exaltado amor divino ao ser humano.  Esta necessidade inevitável não pode ser alterada, nem mesmo pelo próprio Deus. Sem nenhuma dúvida trata-se do amor pelo ser humano, no que um dia ele se tornará. É o amor de Deus à humanidade do amanhã e além do amanhã,  o amor que não pode nos livrar da necessidade de passarmos através do mal e da morte.  Deus renuncia a possibilidade de prevenir o mal, o que ele pode fazer através de sua onipresença.  Ele permite que o mal exista, e ele vem acudir o ser humano e apoiá-lo de uma forma diferente: através de enviar Cristo.

O Filho de Deus e o filho do homem

Porque o Salvador é chamado “Filho de Deus”?  Primeiro temos que compreender que os nossos conceitos do divino são de alguma forma inadequados. Então a palavra “Filho” é em si mesma uma metáfora a qual precisamos primeiro traduzir da  linguagem imaginativa para o nosso pensamento abstrato atual.

Deus é aquele que por um lado é totalmente autossuficiente, o ser perfeito – “como o seu Pai Celeste é perfeito”.  Todavia, não podemos simplesmente chegar à conclusão que devemos confinar Deus na prisão de nossas próprias formas inadequadas de pensar.  Não devemos correr com a nossa inteligência lógica e concluir que o fato de ser Deus completo, isto exclui a possibilidade de Deus “tornar-se”.  Independente dos conceitos filosóficos e teológicos, Deus não é simplesmente um prisioneiro de sua própria totalidade, totalidade esta que  concebemos como “circunscrevente” envolvendo-o.

A natureza de Deus consiste não apenas em “eterno repouso”  mas é também “verdejante” e “em expansão, evolução, desenvolvimento”.  Deus na totalidade de seu eterno ser  é o “Pai”.   Podemos ainda falar de outro aspecto de Deus que é igualmente justificado e real:  Deus está em processo de tornar-se, de evoluir para o futuro: o “Filho”. Devido a essa qualidade de “evolução, desenvolvimento”, o Filho é aquele que carrega em si as forças criativas.  Como é expresso no Evangelho de João (1:3) e nas Epístolas de Paulo, o Filho é o mediador da criação do mundo.   É esse Deus que uniu a si mesmo com a Humanidade: o Deus em cuja própria natureza,  jorra como uma planta,  libertando a si mesma da matéria inerte e se desenvolvendo através dos estágios de crescimento (evolução) – o Deus com um futuro...

O mistério do Deus sem poder

Como é esta intervenção da providência em benefício do ser humano - do Divino Filho no mundo terrestre - compatível com a noção acima de que,  num certo sentido,  o mundo do homem tem estado vazio e que este vácuo favorece o desenvolvimento da independência do homem?

Está a liberdade germinante do homem invadida pela intervenção divina?

Responder esta séria questão com propriedade exige que observemos a forma única,  na qual a entrada de Deus no mundo do ser humano teve lugar. O Deus que apareceu na Terra, não revelou a Si mesmo na plenitude de seu poder. Pelo contrário, o sacrifício divino inerente ao fenômeno é de um Deus que permite eventos no sentido de que estes tomem o seu curso, culminando na cruz do Gólgota.  Esta imagem é tão familiar a nós que com muita dificuldade conseguimos compreender como isso pôde tumultuar tantos  sentimentos,  mesmo entre aqueles mais piedosos seres, em sua aparição ofensiva e enigmática: “para os Judeus uma pedra no caminho, para os gregos uma loucura, uma insensatez”.  O Deus crucificado – ora, um Deus assim é um Deus sem poder.

Vamos enfatizar novamente o ponto: a mesma impotência de Deus é vista no seu silencioso semblante em todas as abominações da Terra, somente que aqui isto é levado ao extremo.  Crucial, no entanto,  é reconhecermos nesta impotência o que aí verdadeiramente se mostra: não a fraqueza de Deus, mas sua autolimitação; um impedimento consciente, uma renúncia no benefício da liberdade do ser humano.

Extraído parcialmente da “Essência do Cristianismo” de Rudolf Frieling. Floris Books ISBN 086315039X